domingo, 18 de janeiro de 2009

Uma semana em Floripa


Eu ía de avião. Ah, como eu queria ir de avião. Mas os dias estavam sendo difíceis pra quem ia viajar nessa época. O caos aéreo ainda era o assunto mais divulgado em toda mídia, principalmente depois do dia 17 de julho de 2007. Eu devia estar em Florianópolis na semana seguinte depois do acidente em Congonhas. Então pra evitar transtornos me colocaram dentro de um ônibus. Tudo bem, não tem muita diferença entre ficar sentado duas horas de vôo, e dezesseis horas de ônibus. Não pra quem dorme feito pedra a viagem toda. Mas infelizmente eu não tenho essa sorte. Passagens compradas, ar-condicionado no frio, último banco ao lado do banheiro e poltrona reservada na janela. Era pra ser uma simples viagem à trabalho, mas aquela semana ia ser uma das mais longas da minha vida.
Passatempo? Quase nenhum se for olhar pelo lado racional. Mas quando não se tem nada pra fazer, além de tentar achar o sono fechando os olhos e todo o lugar vira um imenso círculo de rotina, pelo menos eu, começo a achar algum tipo de distração. Tipo, quantas árvores passam lá fora num intervalo de dez segundos, formar o alfabeto com as letras que aparecem na rua, achar imagens na forma das nuvens, ficar o tempo máximo de olhos fechados na esperança de pegar no sono. Eu sei que parece meio louco, mas é quase impossível não fazer essas coisas quando se tem muito o que pensar. É preciso se distrair, principalmente quando o que mais se tem pra pensar é na possibilidade de perder o emprego, o caso mal resolvido, e uma semana à prova, longe, sozinho, num lugar que você nem conhece. Mas fazer o quê? A gente precisa crescer e abrir mão de certos confortos, e encarar a vida. Então lá fui eu pro Sul, fazer um curso cuja aprovação iria salvar o meu emprego e manteria o sorriso de sempre na minha carteira.
Durante a ida encontrei um antigo amigo meu do ensino médio, Leandro Morani, apelidado de Fábio Bala(jogador de futebol)por motivos que pra mim são totalmente irrelevantes, pois como já disse anteriormente, não sou muito fã de futebol. Conversamos um pouco, rimos bastante dos tempos de colégio, sugerimos ao vento um encontro do pessoal que estudava conosco. E é inevitável a nostalgia que se sente quando encontramos alguém que de alguma forma fez parte do nosso passado. As lembranças, os momentos de palhaçada, de gritaria na sala, daquelas bombinhas que o pessoal da cozinha acendia na sala, e que tem cheiro de peido. Daquela vez o professor Guanabara ficou irado com a turma, saiu de sala, nervoso, quadro meio cheio. Enfim, nessas horas a gente começa a achar que poderíamos ter dado mais moral aos bons tempos que não considerávamos tão bons assim por puro desleixo. E acredite, essa conversa foi só começo de uma eterna reflexão.
No fim da parada do ônibus me despedi do Leandro, já que ele estava numa excursão acadêmica com uma galera da UFRJ. Quanto à mim, voltei para o ônibus escuro com aquelas pessoas estranhas me olhando como se estivessem me lembrando o quão distante eu estava do meu lugar.
A noite e o dia já não faziam tanta diferença dentro daquele ônibus. Não tinha hora pra dormir, e o sono vinha quando não era necessário ter ele por perto. Uns filmecos antigos rolando na televisão. A porta do banheiro abrindo e fechando de tempos em tempos, seguido do anúncio na parte da frente do ônibus. As conversas e risos abafados nos bancos da frente. A lâmpada acesa na poltrona vinte e três que quebrava a escuridão completa da noite. Encurtando um pouco a descrição do cenário: Tédio, puro e simples.
Acho que se fosse em outra época e em outras circunstâncias, aquela viagem com certeza seria muito mais proveitosa do que foi.
Finalmente cheguei à Florianópolis e pra começar minha semana bem, ao levantar da poltrona deixei meu mp3 cair no chão bem do lado do display. O som do vidro quebrando foi o mais perfeito aceno de boas vindas que Floripa poderia ter me dado. Não poderia ter sido melhor, fora as piadinhas dos catarinenses referindo-se ao mp3 como uma vítima de bala perdida. Mas isso era fácil de encarar, eles não são muito engraçados mesmo. Fui ao Hotel aturando o motorista do táxi resmungando igual àqueles desenhos animados antigos. Tudo porque a corrida lhe rendeu dez reais. Enfim, mandei ele se catar e entrei no hotel. Hotel maravilhoso, um quarto ótimo com cama de casal, e um frio de ter que usar dois edredons.
Comecei meu curso, conheci gente nova, fazia as provas, e voltava pro Hotel, tudo sistematicamente premeditado. No café da manha a rotina também era a mesma: um prato com vários pães de queijo e um copo de 500ml de iogurte. Já que ia passar uma semana sozinho ali, pelo menos tinha que dar prejuízo para as tias da cozinha. Toda a noite, o destino era certo: pizzaria. Minha janta não tinha como ser outra, o pessoal do hotel dizia pra tomar cuidado à noite, e as poucas opções que eu tinha eram andar trinta minutos à noite em um bairro que eu não conhecia, e diga-se de passagem que o nome do bairro era "Estreito". Ou ir até a pizzaria ao lado e me afogar nas massas. A solução foi engordar três quilos à mais. Pizzaria de pequeno porte, com no máximo umas catorze mesas, um garçom, um banheiro, dez variedades de pizzas, refrigerantes de 600ml (absurdo não terem em lata), sininho na porta para anunciar a clientela chegando, lá fora uma neblina palpável que esfriava o pensamento, e lá dentro um carioca com duas blusas por baixo de um casaco de couro.
Isso parece até cena de filme de faroeste. Mas sinceramente foi assim mesmo, sem tirar nem pôr nenhum detalhe. Confesso que o ambiente era deprimente, e ainda por cima o garçom veio puxar papo comigo, falando sobre Itália, vinhos, ketchup, pizzas e futebol. Ele falou mais do que eu, mas eu me senti como um bêbado frustrado tendo a atenção de um garçom.
Na realidade, aquela semana já estava me desgastando. O lugar já me fazia ficar cansado sem eu precisar fazer o menor esforço, mas o que mais pesava era a solidão. Acordar e não poder perturbar ninguém, tomar café num salão enorme vazio, me limitar em pensar nas idiotices rotineiras e não fazer ninguém rir com elas. Eram e sempre foram coisas muito difíceis de fazer. A saudade de casa, da família, e dos amigos já era palpável.
Aquele era o último dia de curso e minha última noite no hotel, e achei que isso talvez me faria sentir melhor. Mas ainda era cedo para a aula de vida acabar.
Naquela tarde de sexta-feira, eu voltava do almoço por volta de uma hora da tarde quando encontrei um colega do curso chorando nos braços do professor. Foi uma das piores situações que já presenciei. Não demorou muito pra eu saber que o irmão dele falecera em seus braços à alguns minutos atrás.
Foi inevitável um desequilíbrio emocional durante o resto do dia. Lembro-me perfeitamente que naquela noite eu acordei de madrugada e não parei mais de pensar na minha família e nas pessoas que eu amava. Chorei feito criança. Comecei a analisar tudo o que já tinha acontecido durante todo esse tempo, e nada colaborava com um sono tranquilo: Um avião cai e deixa cerca de 199 mortos, a solidão na viagem, a conversa com um antigo amigo sobre uma boa época, a solidão no hotel, o garçom da pizzaria, e pra terminar com maestria e estilo, o irmão do cara me vem com o papo de querer ficar morto nos braços dele. Naquele momento não conseguia mais ficar calmo.
Você já teve a sensação de não poder ter mais alguma coisa, ou não poder mais desfrutar da companhia de alguém?
Comecei a analisar o valor que eu dava às pessoas e a forma como eu demonstro meu amor por elas. O ruim é que na maioria das vezes nós só pensamos nisso quando sofremos esse tipo de "trauma". A questão é que as pessoas tem um valor pra você. Isso é fato. Seja pouco ou muito, mas tem. E dependendo desse valor, você reage de alguma forma à elas. Se você pode passar mais tempo com alguém, porque não tenta? Se você tem oportunidades de ser mais feliz dentro de sua casa, porque não arrisca? Essas são coisas que podemos perceber agora, e que põe nossa cabeça pra pensar e concluir que o tempo passa. Tudo um dia acaba. E o que você tem feito do tempo que você tem com as pessoas que te amam?
Me entenda bem, não quero apelar para a emoção e conseguir prender sua atenção. Até porque se você chegou até aqui significa que eu a tenho desde o início. Então não estou tentando te emocionar nem espero que você escreva um comentário bonitinho pra me parabenizar por alguma coisa que você tenha lido e achou legal. Vamos tirar de moda frases do tipo: "Eu era feliz e nem sabia" e "Quanto tempo(...)". Irritações, brigas e desentendimentos fazem parte da vida, dessa realidade não podemos fugir. Enquanto estivermos aqui teremos esses infortúnios. Mas as pessoas não são para sempre, elas vão embora, se mudam, terminam os estudos, se formam, se distanciam, morrem. E o que você tem feito enquanto isso não acontece? É como Renato Russo diz: "É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã", e na boa, chega de fazer dessa música um rótulo de personalidade e vamos passar a viver realmente. Hoje podemos usufruir de momentos de alegria e paz com as pessoas que amamos. Tem gente que não tem a mesma chance que você. Então valorize.
Normalmente temos noção do amor que sentimos por alguém quando esse alguém está longe, e esperamos loucamente que o tempo passe, para que possamos revê-lo. Mas tenho aprendido que não é a ausência que deve acabar logo, é a companhia que deve durar ao máximo. Não que eu esteja me gabando, mas tenho posto em prática o que eu estou escrevendo aqui hoje, desde o dia 31 de julho de 2009 quando cheguei na Rodoviária do Rio e vi meu pai. Um sorriso, um abraço e um "eu te amo", e não doeu nada. E acho que até hoje tenho sido assim. Estou no 3ª período da faculdade e fico feliz por ter conquistado grandes amigos em apenas seis meses. Só fico triste em saber que a faculdade vai acabar em.....Ahh!!! Não preciso pensar nisso agora!



Dedico esse texto à minha amiga Jéssica Moreira dos Reis(Quinha).

31 comentários:

Aneli Beloni disse...

Salve, salve... pelo menos eu, começo a achar algum tipo de distração. Tipo, quantas árvores passam lá fora num intervalo de dez segundos Típico de Flávio, "o viajante!"

Após ler esse texto só posso repetir as palavras de C. S. Lewis...

"Nosso tempo é apenas um folego, então é melhor respirá-lo!

beijinhos estrelados!!!

Obs: Lights off :p

Unknown disse...

bacana o texto....florianopolis eh um lugar muuuito bom!
pena pelo q aconteceu em sc, né!?
mas a vida continua...

--
www.moolegal.wordpress.com
o blog q faz jus ao nome!

Anônimo disse...

Onibus é sempre um laboratorio experimental muito bom...
o mais legal disso tudo é agente começar a perceber a partir disso que nos somos reais... todos nós..

Aneli Beloni disse...

Não entendi o comentário do "mólegaal" Kkkkkkk

Mas...

eurri.com

O Kenny... Mó filósofo!

Obs: Esqueci de dizer que meu sonho é ir pro Sul, na próxima vez me leva (Y). Como eu falo praks, cê nem vai precisar ver desenho em nuvens, muito menos contar árvores! E é bem capaz de dormir fácil ouvindo minha voz, hehe

beijinhos estrelados!!!

Flávio Pinheiro disse...

Aposto que o Móo Legal nem leu o texto, pra ter alguma base pra um comentário conciso...hauhauahuahauhauha
Quando ao Kennedy, não entendi nd do q ele disse. hauahuahuahauhaua

Unknown disse...

Que lindo! Gostei bastante do texto e principalmente da frase :"...não é a ausência que deve acabar logo, é a companhia que deve durar ao máximo."
Beijinhos!
http://cgfilmes.blogspot.com/

Fidalgo disse...

po...quero ir pra floripa agora ! hehe

Douglas disse...

patabéns pelo blog
depois passa no meu
http://soanimesdownloads.blogspot.com

A'ZaF disse...

bom cara, odeio viajar de busum...poucas coisas são piores que isso.

Mas se for o caso, nada que a tecnologia não ajude...ouvir uma música bem alto pra não ouvir a voz de mais ngm ou ver um vídeo bacana (ou ainda, ficar tirando fotos e atormentar os outros) ajuda a passar o tempo.

abraços

http://paranoiaelucidez.blogspot.com/

Jeimes Rosa disse...

retribuindo a visita...
muito bom o seu blog.
=D

JéssicaReis disse...

ain ainn... me sinto honrrada...... sou feliz por ter um AMIGO como vc... e um texto incrivelmente lindo e especial dedicado unica e exclusivamente a mim...!!! hahah te amo amigo..... faremos valer a pena a nossa compania...! te amo flavinho.... saudadesssss amigo, muitas saudades!

Caroline Ribeiro disse...

Ler seus textos não é uma questão de paciência...

Bom... só acho que você deveria ter aproveitado mais a viagem.
Me parece que essa sua semana a trabalho no Sul foi muito solitária. Antes mesmo de você escrever eu já havia notado.
Então, de uma próxima vez se quiser me levar pra fazer companhia... fique a vontade. husuhsuhuhs

O que você quis transmitir pode parecer clichê para alguns, mas de forma alguma deixa de ser a mais pura verdade.
Só notamos/expressamos a importância de alguém em nossa vida, quando perdemos esse alguém.

Me emocionei quando falou do seu pai: "Um sorriso, um abraço e um "eu te amo", e não doeu nada."

Beijão Flávio.

Mr. Andrógyni-# disse...

NOSSA, HAJA PACIÊNCIA PRA LER, MAS ESTA BEM ELABORADO, VC REALMENTE SABE SE EXPRESSAR, LINDO O BLOG !!!!!


http://dupladameianoite.blogspot.com/

Anônimo disse...

Ja fiquei pensando muito no que vc escreveu, e foi depois da morte do meu avo... como vc disse temos que sofrer algum 'trauma' para pensar nisso e é triste quando vc percebe que perdeu e nao pode mudar nada... triste, mas passas... hj procuro ser diferente do que era com ele... tentando sanar um pouco meu resentimento com outras pessoas, como um pedido de desculpa a ele.. mas é isso ai... adori o texto.. e q saco a viajem heein auhauhauha

beijos
byy

Luiz Marconi disse...

Viajar de busao é embaçado, depois de 3 horas a paisagem que era linda cansa, mas se o destino final é Floripa ai ja tem aquele algo mais.
Gostei do texto começa de um jeito e acaba sendo reflexivo, :)
voltarei..

Unknown disse...

também nao entendi o que o mó legal falou @-@~

eu adoro viajar de busao , ver as paisagens rs

ah vim avisar

capítulo 6 escrito e postado -> http://cronicasdesafira.blogspot.com/

Lais Adelita

tiu disse...

'

poxa o segredo é ficar tranquillo.

Flávio Pinheiro disse...

Ouça os conselhos do nobre tiu: "poxa o segredo é ficar tranquilo."

hauhauahuahauhauahuahauhauahuahaa.....

Robson Pinheiro disse...

Ai, eu só li depois da foto do cachorrinho prabaixo, mas ó mandô: "as pessoas não são para sempre, elas vão embora, se mudam, terminam os estudos, se formam, se distanciam, morrem."
não deixemos para expressar depois da morte nossa devoção e amor pelas pessoas que amamos.
vivamos hoje o amor pois é oque nos resta, quando tudo acaba e todos se vão, somente os que nos amam estão conosco

Anônimo disse...

Que isso Feraa! apesar d preferir os textos curtos. esse me chamou a atenção no início e li até o fim com muito gosto.e me amarrei muito do Final.. é Flavião.. vc pode ter certeza q vou desfrutar e aproveitar ao máximo todos os momentos com vc e todos nossos amigos na facul cara.. aliás.. acho q já temos feito isso néah? HSUAHs. continuaremos e daremos mais intensidade! Parabéns Brother.. to aqui sempre! abraçooo!

PW disse...

boa noite Flávio, bacana o seu blog, vc deixou um recado no nosso blog coolturanarede.blogspot.com, gostariamos de agradecer pela visita, não está afim de uma parceria com a gente?? um abraço e até mais!!!

pw e rooco

Paula disse...

Muito interessante...

Um post descritivo que se pode tirar bastante intensidade das descrições. =)

Alma sensível e atenta. Adorei.

Beijos.

ps. encontrei seu blog na comunidade do blogspot

Myh Cabral disse...

muito dez seu blog...o texto e bem legal(amo viajar)...e adoro floripa...lugar magico...

Bárbara Cristina disse...

"É a companhia que deve durar ao máximo..." Gostei disso!Quero visitar seu blog com mais tempo!Mas de primeira impressão gostei bastante!beijos!

Anônimo disse...

adorei o texto...tb fui para floripa esses tempos! Vc escreve bem...ótimo senso!

bjos

Aneli Beloni disse...

Putz! Tá parecendo flogãão isso aqui...

"Flávio legal seu blog, passa lá no meu depois!" Kkkkkk

Alguns comentários, foram tão plausíveis quanto o texto. Falo logo!

Obs: Continuo não entendendo o mó legal, e o legal é que não entendo acompanhada... Laís (Y)

beijinhos estrelados!!!

Lights off

Anônimo disse...

Parabéns pelo blog, adorei o post, abrass.

=)

Anônimo disse...

- AMEI ♥

Você Tem uma Grande Capacidade de escrita, Parabéns Seus Textos são Mto Inteligentes!

Seu Pilantraa ;)

Anônimo disse...

pelo menos eu, começo a achar algum tipo de distração. Tipo, quantas árvores passam lá fora num intervalo de dez segundos...

Aff as vezes te axo mt ...mt idiota...

Leandro Morani disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Leandro Morani disse...

É rapaz!!
descobri por acaso esse texto...

tem um artigo no meu nome em algum lugar dessa "bilhométrica" internet e coloquei meu nome no Google. Digamos que levei um susto agradável!

Ainda lembro desse dia naquele posto de gasolina, às 7:00hs da manhã de um domingo muito frio.

Fiquei impressionado com o seu texto. Bem elaborado e de opniões precisas.

Te mando um recado no orkut pra vc saber que eu li e comentei.

Obrigado por me citar.

Citando o sábio:
"Viver é como pisar na merda. Você fica puto na hora, mas depois que limpa, ri pra caralho!!"

Abraços